sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Muito trabalho, de novo. Será que nunca vou aprender a simplesmente desfrutar o ócio?

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Na fisioterapia o assunto ontem era política. Um fisioterapeuta defendia a eleição do candidato corrupto. Com argumentos os mais sofríveis possíveis. Já ia me exasperar com a burrice reinante. Me contive a tempo. Concentrando na dolorida articulação do antebraço.

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Engordando como uma leitoa.

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Seriados novos:
- The office (por sugestão do Gabriel) - sobre o cotidiano de um escritório. Só quem já viveu sabe que o desespero que há por trás do humor grotesco e politicamente incorreto.
- Merlin (indicado pelo novo amor) - para adolescentes, sobre a adolescência dos heróis da távola redonda. Bonitinho.
- 24h - suspense sobre o dia a dia de uma agência secreta americana e seu agente meio paranóico. Clichês de sempre, mas o uma forma interessante de roteiro - pontuado por sincronia entre as situações e rigorosamente cronometrado por um relógio digital.

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Hipersensibilidade: entrando em pânico (contido) em cenas de maldade, tais como as da personagem-feiticeira Cora, de Once upon a time. Ou, ridiculamente, as crianças alienígenas ocas e malvadérrimas do quase cômico Dr. Who.

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Inferno zodiacal fora de época: agora é o celular dando pau (R$ 600 para trocar por um novo no duvidoso programa de garantia da marca). 

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

diário - 07-08


Almoço do dia dos pais adiantado. No árabe popular cheio de gente. Conversas sobre trabalho, conselhos esparsos, sobremesa, café e compras de material hidráulico para a obra. Filho é uma experiência indescritível.

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Estou trabalhando em histórias curtas. Com dificuldades de encontrar de argumentos ou enredos suficientemente intensos para transformá-las em minicontos. As fábulas de Esopo vieram a calhar.

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Avalanche de trabalho repentino.

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Necessidade urgente de resolver questões irresolvíveis. Tais como adolescência tardia.

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Me esmerando escrever mensagens de condolências. 2 só nos últimos dias.Cada uma mais horrorosa que a outra. Acho que dá um pânico súbito que impede discernimento.

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Em plena campanha política, quem diria! Tudo pelo novo amor.


segunda-feira, 4 de agosto de 2014

diário - dia 4


Retomando. Revendo. Reformando. Remodulando. Reestruturando. Revolvendo. Reescrevendo. Respondendo. Resgatando. Refazendo. Retirando. Recalcitrando.

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Ontem show de Hermeto Pascoal e banda, na Caixa Cultural. Telúrico e sublime. Músicos impecáveis. E a voz esquisitíssima da diva cabocla Aline Moreno.

Depois, sidra, omeletes e crepes à francesa com o amigo, o filho e a nora.

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Inferno astral fora de época: quebrando toda a louça da casa; afundando a traseira do carro no container de entulhos; tossindo como um cachorro louco; curando a tendinite; driblando os estados depressivos; convivendo com uma pereba na ponta do nariz.

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Tomando decisões contraproducentes, mas esteticamente imprescindíveis. Me preparando para o futuro próximo e o distante.

domingo, 29 de junho de 2014

diário-planilha

Contabilidade das 2 últimas semanas:

3 projetos planilhas justificativas somatórios formulários cronogramas orçamentos metas objetivos desdobramentos mapas currículos gráficos cifras ajustes portfolios e-mails etc. 1 hora imobilizado, entre 3 caminhões, aguardando a liberação da estrada. Muitos cigarros & nem uma gota de álcool. 2 míseras páginas do Machado e 1 ou outra página do Plutarco ou do Mãe antes de cair no sono. 1 pacote de doce de amendoim. 1 pote de doce de leite com pau de mamão. 1 garrafão de água mineral. Sensação de dúvida quanto a ter ou não valido a pena a trabalheira.

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Sessão Netflix depois do estresse:

Bonequinha de luxo (Breakfast at Tiffany's): figurino impecável de Audrey Hepburn. cena do início impactante para justificar o título. A sexualidade obscurecida do michê-escritor. A festa quase feliniana. O quase-noivo rico brasileiro. O disco de aula de português de Portugal. O gato sem nome que rouba a cena. Imperdoável só ter visto agora.

Drop dead diva: hilário nos primeiros episódios, mas começando a ficar repetitivo.

O 13o. Guerreiro. Filminho ruim com o sempre sofrível Antonio Banderas interpretando um poeta árabe que se juntou a um grupo de vikings trash (!) para guerrear contra seres primitivos  na Escandinávia.

Orange and black. Série também chatinha sobre a vida de presidiária de uma ex-lésbica chique. Parei no 2o. episódio.

Gonzo: The Life and Work of Dr. Hunter S. Thompson. Documentário sobre o escritor-jornalista que viveu intensa e ativamente os anos 70 nos EUA. Visto a conta-gotas.

Malévola. Linda Angelina Jollie, como sempre. Efeitos especiais de encher os olhos. Argumento legal. Só não entendi o motivo de ter achado o filme tão chato.

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Ninguém para dançar a quadrilha de São Pedro.
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Do novo amor, os óculos. E sono sempre atrasado.




da série: cenografias improváveis



bonequinha de luxo (1961)

sexta-feira, 20 de junho de 2014

ainda sobre a correspondência de machado de assis

Machado responde uma semana depois. A carta publicada no jornal onde trabalhava é a própria crítica solicitada.

A introdução é sobre a incipiente e árdua tarefa da crítica literária, da qual era um precursor no Brasil. Esbraveja contra a futilidade e a vaidade dos contemporâneos e contra a malévola influência estrangeira.

É elegante nos elogios a Alencar. Ironiza sutilmente as adjetivações da descrição da Tijuca, pelo autor consagrado. Para não ficar atrás, também ilustra o texto com personagens e passagens mitológicas.

Elogia Castro Alves. Minimiza os senões e as imperfeições de Gonzaga, justificando-os com a pouca idade do autor. Vislumbra um futuro brilhante ao poeta.

Futuro esse que só se materializou postumamente. Um ano depois da visita a Alencar e Machado, Castro Alves fere o pé com um tiro, em uma caçada. A ferida agrava-se, até a amputação da perna (sem anestesia, segundo o historiador Sérgio Buarque de Holanda). Seu estado de saúde é delicado, devido à fragilidade provocada pela amputação e pela tuberculose. Volta para a Bahia. Morre em 1871, com 24 anos.

quinta-feira, 19 de junho de 2014

leitura clássica: correspondência de machado de assis

José de Alencar escreve a Machado pedindo que este publique uma crítica sobre o jovem poeta Castro Alves, vindo direto da Bahia. É uma carta toda empolada, o oposto do estilo do destinatário. Como não podia deixar de ser, para conseguir o intento, Alencar finaliza a missiva com uma bajulação descarada:

Lembrei-me do senhor. Em nenhum concorrem os mesmos títulos. Para apresentar ao público fluminense o poeta baiano, é necessário não só ter o foro de cidade na imprensa da Corte, como haver nascido neste belo vale do Guanabara, que ainda espera um cantor.

Seu melhor título, porém é outro. O senhor foi o único de nossos modernos escritores, que se dedicou sinceramente à cultura dessa difícil ciência que se chama crítica. Uma porção de talento que recebeu da natureza, em vez de aproveitá-lo em criações próprias, teve a abnegação de aplicá-lo a formar o gosto e desenvolver a literatura pátria.

Do senhor, pois, do primeiro crítico brasileiro, confio a brilhante vocação literária, que se revelou com tanto vigor.

Seja o Virgílio do jovem Dante, conduza-o pelos ínvios caminhos por onde se vai à decepção, à indiferença e finalmente à glória, que são os três círculos máximos da divina comédia do talento.

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A carta é rebuscada. Alencar cita o tempo o todo os clássicos, em uma erudição empoeirada aceitável no século XIX mas quase hilária na pós-contemporaneidade. Em 8 páginas, são inúmeras as figuras, trocadilhos, aforismos e eruditismos pérolas que Alencar pontua o texto. Vale a pena:

Nasceu na Bahia, terra de tão belos talentos; a Atenas Brasileira que não se cansa de produzir estadistas, oradores, poetas e guerreiros.

A genealogia dos poetas começa com seu primeiro poema.

O talento é uma religião, a palavra um sacerdócio - para elogiar o caráter do Dr. Fernandes da Cunha - um dos pontífices da tribuna brasileira.

Receber Cícero que vinha apresentar Horácio, a eloquência conduzindo pela mão a poesia, uma glória esplêndida mostando no horizonte da pátria a irradiação de uma límpida aurora.

Carecia de ser Hugo ou Lamartine, os poetas-oradores, para preparar esse banquete de inteligência.

Em literatura não há suspeições: todos nós, que nascemos em seu regaço, não somos da mesma família? Mas a todos o vento da contrariedade os tem desfolhado por aí, como flores de uma breve primavera.

Alguns têm as asas crestadas pela indiferença; outros, como douradas borboletas, presas da teia d'aranha, se debatem contra a realidade de uma profissão que lhes tolhe os voos.

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Sobre a Tijuca, no Rio de Janeiro, onde Alencar morava:

O senhor conhece essa montanha encantadora. A natureza a colocou a duas léguas da Corte, como um ninho para almas cansadas de pousar no chão.

Aqui tudo é puro e são. O corpo banha-se em águas cristalinas, como o espírito na limpidez deste céu azul.

Respira-se à larga, não somente os ares finos que vigoram o sopro da vida, porém aquele hálito celeste do Criador, que bafejou o mundo recém-nascido. Só nos ermos em que não caíram ainda as fezes da civilização, a terra conserva essa divindade de berço.

A Tijuca é um escabelo entre o pântano e a nuvem, entre a terra e o céu. O coração que sobe por esse genuflexório, para se prostrar aos pés do Onipotente, conta três degraus: em cada um deles, uma contrição.

A chuva borrifou de aljôfares; as névoas delgadas resvalavam pelas encostas como as fímbrias da branca túnica roçagante de uma virgem cristã.

O primeiro degrau seria o Alto da Boa Vista, de onde se descortina longe, serpejando pela várzea, a grande cidade réptil, onde as paixões pululam, etc etc. O segundo degrau é para as bandas da Gávea, em um lugar chamado Vista Chinesa. Ali, escreve Alencar, Deus entregou a um de seus arcanjos o pincel de Apeles, e mandou-lhe encher aquele pano de horizonte. O terceiro degrau é o Pico da Tijuca, de onde os olhos deslumbrados veem a terra como uma vasta ilha a submergir-se entre dois oceanos, o oceano do mar e o oceano do éter.

Prossegue:

Nessas paragens não podia meu hóspede [Castro Alves] sofrer jejum de poesia. Recebi-o dignamente. Disse à natureza que pusesse a mesa, e enchesse as ânforas das cascatas de linfa mais deliciosa que o falerno do velho Horácio.

A natureza da terra de Castro Alves era comparável à exuberância da Tijuca. Lá, ela abandona-se lasciva como uma odalisca às carícias do poeta.

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Depois dessa breve introdução, Alencar desmancha-se em elogios às excelências da língua portuguesa no estilo de Castro Alves. Afirma que o poeta é discípulo de Vitor Hugo. Chama-o de Ticiano da Literatura. Fala que os moldes ousados da frase de Castro Alves são como os de Bevenuto Cellini. Afirma faltar maturidade e de pequenos senões em alguns trechos da peça Gonzaga, justificáveis pela tenra idade do poeta. Assim por diante.

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Alencar, aos 40 anos, era já um escritor consagrado. Machado, aos 30, era um jornalista reconhecido mas ainda não tinha alcançado o auge literário. Castro Alves, 21 anos, apresentava ao grande Alencar os manuscritos da peça Gonzaga, encenada algumas vezes mas só publicada postumamente, 3 anos depois da visita ao Rio de Janeiro.

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Dever de casa para o leitor que conseguiu ler até aqui: pesquisar na Wikipedia os nomes próprios citados nos trechos extraídos da carta escrita por José de Alencar a Machado de Assis, em fevereiro de 1868.

diário depois da invernada


O céu azul do inverno e a luz da tarde dourando tudo. Azul e ouro como a sala do palácio da Rainha Vitória, na Escócia, no filme visto outro dia.

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Por falar em filme, a crueldade, a corrupção, a falta de escrúpulos durante toda a série e concentrada no último episódio de Os Bórgias: torturam e cortam o dedo do filho adolescente da inimiga Catarina Sforza. Cesare, o cardeal primogênito bastardo do papa Alexandre VI, assassina o irmão general do exército papal e sifilítico Juan Borgia. Antonetto, o capataz gay de Cesare, tortura até quase a morte, corta a língua, e auxilia a queimar na fogueira Savonarola, o frade florentino, visionário e louco. Por o próprio provador de alimentos consegue envenenar o papa.

Se eu acreditasse em reencarnação, certamente eu teria vivido por ali. Se soubesse ler e escrever, teria escrito um diário, perdido para sempre.

Ou, mais provável, teria sido analfabeto. Quem sabe um cavalariço, como o belo Paolo, um dos amantes de Lucrécia? uma prostituta romana? um peixeiro ou vendedor de batatas? um peregrino? um frade? um penitente fanático?

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Ainda sobre poderes sobrenaturais:

Ele me telefonou reclamando de dor insuportável nas costas. Que eu fosse buscá-lo no trabalho dali a meia hora. Desliguei. Do nada minhas costas começaram a doer. Muito. 15 minutos depois ele liga de novo. Dizendo que eu não precisava me dar ao trabalho de me deslocar tantos quilômetros para buscá-lo, pois a dor que ele sentia desaparecera milagrosamente.

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De manhã, no rádio do carro, tocou Construção, de Chico Buarque, cantada por Zé Miguel Wisnik e Luiz Tatit.

Eu tinha 15, 16 anos (lá pelo fim dos anos 70) mas era totalmente imaturo quando ouvi a música pela primeira vez.

Foi impactante. Talvez um dos elementos que contribuíram na passagem da infância para a adolescência. Comprei todos os discos dele, e de quebra, muita MPB. Depois dessa fase nunca mais ouvi a música.

Hoje, quando começou a tocar no rádio, parei o carro no acostamento. Para prestar atenção na letra. Primorosa. Nem precisa dizer que a letra é extensa e as rimas são todas com palavras proparoxítonas, isso a gente aprendeu no cursinho pré-vestibular. O maravilhoso é a poesia de cada verso.

Na primeira estrofe o texto é quase literal, situando a história na realidade concreta. A partir da segunda estrofe a estrutura dos versos é a mesma, alterando-se somente as últimas palavras (proparoxítonas), transportando o ouvinte (ou o leitor), degrau por degrau, da construção real para uma construção paralela, essencialmente mágica. Para, no último verso, fazer o leitor (ou o ouvinte) em queda livre, estatelar-se na contramão da realidade palpável. Atrapalhando o cotidiano do sábado.

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Depois da carência exagerada da invernada, o dia de quase verão que fez hoje açulou os instintos de Zildinha. A bichana estava indomável. Não me deu bola. Nem um ronronar, um miado, sequer um olhar. Passou o tempo todo no quintal, entre as touceiras de plantas ou sob a jaboticabeira espreitando os pássaros. Nem fugiu de medo dos micos. Mal teve tempo para comer e fazer as necessidades na caixa de areia.

Agora mesmo pulou na escrivaninha. Eu, crente que ela ia sossegar, pedir cafuné no focinho. Que nada. Da mesa ela saltou para a janela e da janela para o jardim, de novo. Como um relâmpago. Agarrados na pele muitos carrapichos, folhas e ramos secos e um cocozinho que, talvez na pressa ela, sempre tão higiênica, tenha se esquecido de enterrar.

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Lendo a correspondência de Machado. Mas isso será tema para outra postagem.

leitura imperdível da semana

Brasília 5.2 cinema e memória
de Berê Bahia
Edição do autor
2012

Uma reflexão sobre a história de Brasília através dos filmes que registram a saga da construção, da mudança da capital e seus desdobramentos políticos, culminando com o golpe militar de 1964, os anos de chumbo da ditadura, a abertura, a anistia, as eleições diretas para presidente, a volta da redemocratização e finalmente o cotidiano da cidade revelado pelas lentes dos brasileiros e brasilienses.
(do texto de apresentação, pela autora).

Leitura muito agradável. Desde os primeiros documentários feitos para cine-jornais da época da construção da cidade até os grandes clássicos do cinema brasileiro que passaram pelo Festival de Cinema de Brasília.

Paralelamente à exaustiva ficha técnica e sinopse dos filmes, Berê Bahia fala sobre a biografia dos diretores, atores e outros profissionais realizadores, narrando situações anedóticas de detalhes curiosos.  Isso tudo situado e contextualizado aos fatos mais importantes da história brasileira no período.